Mal odor vem do dinheiro advindo da corrupção que apodrece a política

Pobre Brasil, tem o melhor congresso que o dinheiro pode comprar. A política agoniza na lama da corrupção. Interesses pessoais fecham as portas para a justiça e o bem comum. O cinismo e desfaçatez no discurso de Arthur Lira não deixa dúvidas: “…devolver esse superpoder para o seu único e legítimo dono, o plenário da Câmara. Esse plenário que eu passei os últimos 10 anos da minha atividade parlamentar, em pé, no chão de fábrica, trabalhando pelo meu país, trabalhando, ao lado dos meus deputados, do nosso partido…”.

Excelentíssimo deputado, não há democracia sem o povo. A democracia é o governo do povo, pelo povo, para o povo. Leia Fratteli tutti. Nela, papa Francisco ensina que é necessário pensar a participação social, política e econômica “que incluam os movimentos populares e animem as estruturas de governo”, pois, “a democracia atrofia-se, torna-se um nominalismo, uma formalidade, perde representatividade, vai-se desencarnando porque deixa fora o povo na sua luta diária pela dignidade, na construção de seu destino” (n.169)

O “superpoder” tem como “único e legítimo dono” o povo brasileiro. Um povo cansado dos discursos vazios de “picaretas com anel de doutor”. Um povo desprezado por um Congresso corrupto a serviço dos poderosos. O povo abandonado à sua própria sorte, é feito de idiota. Não são políticos, apenas charlatões aproveitadores empenhados na destruição do país. São inimigos dos pobres.

São muitos os parlamentares em situação delicada com a Justiça, inclusive o excelentíssimo presidente da Câmara dos Deputados, denunciado por corrupção e organização criminosa, lavagem dinheiro e crime contra a honra. É extensa sua ficha criminal.

A corrupção apodrece a política. O Congresso fede. Fede a dinheiro, o esterco do diabo (São Basílio). A corrupção abre as portas para todos os tipos de crimes. Pobre Brasil! Tem um governo sustentado pela corrupção.

Papa Francisco destaca em Fratelli tutti que “a grandeza política se mostra quando, em momentos difíceis, se trabalha com base em grandes princípios e pensando no bem comum” (178). E “a caridade política expressa-se também na abertura a todos. Sobretudo o governante é chamado a renúncias…” (190).

Convido o deputado e seus pares a abandonar o tal “chão de fábrica” que lhes rende subsídio mensal de R$24.833,05 somados a cota para o Exercício da Atividade Parlamentar – que varia entre R$ 30.788,66 a R$45.612,53 conforme o estado; auxílio moradia R$ 4.253,00 ou apartamento de graça; diárias em viagens oficiais: R$ 524,00 no Brasil, US$ 391,00 na América do Sul, e US$ 428,00 para outros países; R$ 111.675,59 por mês para pagar salários de até 25 secretários parlamentares, sendo que os encargos trabalhistas – 13º, férias e auxílio-alimentação – de tais secretários não são pagos com a verba de gabinete, e sim com recursos da Câmara; restituição dos gastos com despesas médicas; 2 salários no primeiro e último mês de cada legislatura a título de ajuda de custo.

Chão de fábrica, deputado, é a rua, a feira, o pátio, o barracão, a loja, o restaurante, onde os brasileiros trabalham mais de 44 horas semanais em troca de um ou dois salários mínimos para comprar alimentação, moradia, educação, saúde, transporte, vestuário… dele e da família. A pesquisa Distribuição de renda nos anos 2010: uma década perdida para desigualdade e pobreza do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) indica que enquanto a renda per capita dos 5% mais ricos subiu quase 9% no período 2015-2018, os 50% mais pobres da população viram sua renda média encolher 4%.

O Brasil soma mais de 14 milhões de desempregados. Pais, mães que não têm o que dar de comer para os filhos. O desmonte das políticas públicas a partir da PEC do teto de gastos, agravado pela pandemia Covid-19 e a descontinuidade do auxílio emergencial traz de volta uma triste realidade ao Brasil: a fome! São mais de 10 milhões de pessoas vivendo em situação de insegurança alimentar.

Os políticos não estão à altura dos desafios econômicos, ambientais e sociais brasileiros, vendem-se em troca de cargos e verbas. Cada deputado custa R$2,14 milhões por ano ou R$174 mil por mês. Subsídio pago com o dinheiro do contribuinte, aquele que ganha pouco mais que dois salários mínimos por mês.

O desprezo pelos pobres e pelos 225 mil mortos e milhares de enlutados pela pandemia ficou escancarado na festa da vitória regada a champanhe, música e canapés que varou a madrugada. Endinheirados brindaram a vitória da corrupção enquanto o país afunda. Canalhice paga com dinheiro público. Macabro. Escândalo. Escárnio!

A Câmara dos Deputados é bem pior do que pensávamos. É repugnante. Como é possível que o poder legislativo de um país da importância do Brasil dependa de pessoas de tão baixo nível?

*Élio Gasda é doutor em Teologia, professor e pesquisador na Faje. Autor de: ‘Trabalho e capitalismo global: atualidade da Doutrina social da Igreja’ (Paulinas, 2001); ‘Cristianismo e economia’ (Paulinas, 2016)

Fonte: Dom Total

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